27 de jun. de 2009

Nailpolish

Ela mudou a cor do esmalte, penteou o cabelo diferente e saiu com um sorriso no rosto. Nada demais, nada de menos, mas uma vontade de viver e sentir o novo a flor da pele como o vento batendo no rosto com sabor de fruta madura. Ela mudara a cor do esmalte, e comprou novos livros, leu todas as orelhas tentando absorver o máximo de conhecimento possível, tudo novo, de novo. E assim, como um cameleão se camuflando na paisagem, ela saiu a procura de novos amigos, novas vidas. Era a hora de agarrar o touro pelos chifres e dominá-lo. Sem saber, ela havia mudado a cor do esmalte e mesmo assim todo mundo soube que aquele rosa forte não era comum, nada de normal, nada de bizarro. E as horas passaram, os dias e a semana também. O rosa já não era mais o mesmo, ela já não era mais a mesma. Mais uma demão do cintilante numa tentativa boba de capturar aquele momento para sempre. Riu, foi em vão, nada que um pouco de acetona não resolvesse. Então, removida a camada, ficou aquela pequena tela em branco distribuída entre os cinco dedos de cada mão, e com ela mais um milhão possibilidades, mais milhão de novidades e todo o tempo do mundo pra usar.

16 de jun. de 2009

Desencontro




Guardei uma carta tua
Achei-a um dia desses,
Entre fotos antigas
E pétalas de rosas secas
Reli tuas palavras,
Idéias concatenadas
Em rimas
Que hoje em dia,
São pobres e sem sentido
Fomos apenas mais um erro
do atrapalhado cupido.

15 de jun. de 2009

Memórias de uma anoréxica

Há não muito tempo atrás um dia, em meio ao emaranhado de idéias eu lhe encontrei, luz altiva que me guiava pelos caminhos tortuosos. Você me ajudava tomar decisões, escolhas; a compreender que uma bolacha ao invés de duas, meia cenoura eram melhores que um cheeseburguer, não porque este último é mais calórico, mas porque essa opção me faria mais feliz. Andava em direção à sua luz, porque não sabia fazer de outra forma, qualquer outro caminho me levaria ao abismo e estava fadado ao fracasso. Sua luz me purificava, me trazia alegria e realização. Oh, Luz altiva, que me ajudava a discernir o certo do errado, o querer e o não querer. Me guiava pela sua certeza e segurava minha mão no momento de descontrole. Luz Imaculada, transformou-me em seu anjo guerreiro e lutei por sua causa até o fim, carregou-me junto a sua perfeição e me converteu em sua imagem e semelhança. Aplacou a ânsia de minha alma e trouxe a felicidade plena que tanto busquei.

Ainda que esta fosse a última opção, e ainda que fosse de fato insanidade, desistir não era uma possibilidade, apesar de tudo, era essa a realidade. No final de contas, tudo se resumia em quantos quilos foram perdidos e quantas calorias eram ingeridas. E mesmo que dissessem que estava tudo bem, e mesmo que tudo estivesse bem. Havia o abismo, o vazio e o nada; e também os fantasmas seculares que atormentavam nas noites frias. Suspiros errantes murmuravam verdades não ditas, palavras mal ditas que não deixavam serem esquecidas. Rimas antigas retornam, mas eram atenuadas pela doce brisa que soprava. Luz, pureza e sensibilidade, tudo o que faltava para sobrepor a mediocridade. O vazio inexplicável, e por mais que se tentasse não era preenchido.

Mais um dia, mais uma refeição, aflição que não acabava. Auto controle, poder sobre si mesmo, busca infindável pela perfeição que nunca chegava, porque menos era sempre mais e o céu, o limite. A gordura imaginária escondendo a verdade, criança lutadora que dissimulava a fraqueza por trás da força fingida. Fugir ? Impossível, cada segundo se traduzia na corrida contra a balança. Por que o peso? Porque a única liberdade que restava era a liberdade do corpo. Ele era meu e ninugém poderia interferir, no entanto, em oposição a isso, existiam todos os papéis e todas as máscaras utilizadas no cotidiano, e sim, elas sufocavam. Na busca pela essência, pelo real, perdi-me em mim mesma e as barreiras foram transpassadas. Medo? Jamais. As asas construídas não deixariam cair, existia a leveza para voar.

E nesse emaranhado de idéias eu me perdi, quebrei minhas asas, e caí, caí, caí até chegar no chão. É lá fiquei um bom tempo exorcisando todos os fantasmas perdidos da noite. E quando menos esperava tudo pareceu tão simples, tão bobo. Eu em mim, me bastava. Levantei, e segui em frente.

14 de jun. de 2009

Ontologia




Amar-te,
Esse dever-ser,
Disfarçado
De imperativo categórico
Que corre na veia
E a alma incendeia.

12 de jun. de 2009

Prisão





Vou te encolher,
e guardar num potinho
Porque assim miudinho,
Tu não vais me deixar

Vou te colocar,
Num desses potes
coloridos de balas,
ou no da goibada açucarada
E nunca vais me escapar.

11 de jun. de 2009

Wild Horse




Abri meu coração de vagarzinho,
De medo, pequenininho,
Sem saber amar você.
Que chegou, a cavalgada,
Entrou em disparada
E eu apaixonada,
Sem saber o que fazer.

4 de jun. de 2009

Os Outros




É fácil culpar os outros. É simples dizer que chegou atrasado porque o ônibus demorou, ou que a nota da prova foi baixa porque o professor é carrasco ou que engordou porque no mundo moderno a quantidade de gordura saturada nos alimentos é altíssima. Vivemos nessa sociedade paternalista, assombrados eternamente pelo dilema hegeliano do senhor e escravo, porque mesmo que tenhamos acesso à liberdade, será que a queremos de fato? Já diriam os ensimentos budistas que a ignorância é uma dádiva, e seguindo a velha política romana panis et circenses não importa se o estômago está doendo de fome, mas sim que o dinheiro do bolsa miséria vai ser providencial para comprar o ingresso do jogão do Brasil em 2014.

Saímos julgando tudo e a todos e assim culpamos os países desenvolvidos pelo aquecimento global, o capitalismo pela má distribuição de renda e Freud culpou até a sua mãe (e em consequência a dos outros) pelos males da psicologia. É claro que a culpa da crise econômica é toda dos políticos corruptos e o rombo na previdência é devido apenas à má administração dos recursos públicos e é óbvio, da corrupção, de novo. Mas ruim mesmo, é o senador que roubou a dinheirinho da merenda escolar, o outro que construiu um castelo e pasmem, sonegou os impostos. Enquanto isso, mulheres fingem-se de grávidas na fila do supermercado, a pobre velhinha viúva repassa a pensão do marido ao afilhado e contadores inventam mil e uma maneiras de livrar seus clientes do leão.

A verdade é que sempre que o relacionamento termina, o problema foi do outro que não soube nos entender, e é irritante como nossos pais que não conseguem enxergar que estão sendo totalmente intransigentes. O trânsito estressante porque "ninguém sabe dirigir direito", a rua alagada por conta do bueiro, que logicamente entupiu-se sozinho, e já disse que não foi eu quem deixou a luz acessa.

E a pergunta que não quer calar: até quando vamos continuar culpando os outros e vamos começar a assumir alguma responsabilidade ?